Perdendo a hora da morte

20180614_171003-2.jpgAcordar tarde tem um certo ônus, parece que nas “horinhas” a mais que você estava sonhando, o mundo girou em dobro e, quem já estava acordado tem “zilhões” de informações a respeito dessa volta extra.

Hoje foi um destes dias e, a novidade quente (neste caso “fria”) era a morte de um vizinho. Não era um amigo de infância, até porque ele tinha no mínimo uns dez anos mais do que eu. O morto em questão estava mais para um “conhecido popular”, sabe?! Aquelas pessoas que não fazem nada de extraordinário mas, que por pequenos atos de indiscrição pública acabam se destacando do resto da comunidade.

Notei varias pessoas em torno do acontecimento, pessoas que normalmente não se reuniam ou se acercavam ao morto, quando este ainda estava vivo. A morte sempre reune e a vida nos afasta um dos outros, simplesmente porque é assim que nós escolhemos viver. E se alguém ousa querer estar próximo dos seus, em vida, padece de infinitos escarnios por parecer dependente ou carente, sendo que seu único desejo é absorver experiências, criar memórias e dar luz à vida de alguém que um dia já não estará aqui para brindar nos com esses pequenos prazeres.

Após a dispersão das pessoas, das sirenes e do corpo, somente ficaram ruídos dispersos no ar:

– Rasque, rasque… rasque, rasque…

Era o ruído da vassoura esfregando os produtos químicos dissolvidos em água no chão, colocando um odor mais forte no ar, pois é preciso tirar o cheiro da morte dali.

A morte, uma consequência tão natural da vida, para muitos é suja. E é na morte dos outros, que nos sentimos afetados a ponto de pensar que um dia seremos nós na caixa, seremos nós que, antes de partir veremos o mundo em volta carregado com a nossa presença mas, todos em volta estarão a postos para começar a varrer qualquer traço de nossa existência, de todos os lugares que tocamos pela última vez.